segunda-feira, 1 de julho de 2013

PENÉLOPE PARA MULHERES



Assisti a uma comédia, de 2007, chamada Penélope e confesso que minhas projeções com relação a ela eram de que se tratasse de algo sem nenhum proveito, feito apenas para entreter. O roteiro é daquele conto de fada tradicional: garota nasce com um defeito (no caso, aparência de porco) que é resultado da maldição de uma bruxa e cujo feitiço só será quebrado quando “ um de sua própria linhagem a amar e a tomar para si por toda a vida”. A mãe passa o tempo a procurar alguém de sua própria linhagem (sangue azul. Alguém aí falou príncipe encantado?) e para isso submete a garota a vários constrangimentos. Um dia aparece um pretendente que não foge, mas então é Penélope quem foge dele. Todas nós já passamos por isso na vida, não é? Achamos que alguém pode nos ferir porque somos assim ou assadas e fugimos.

Mas voltando ao filme, neste ponto a personagem se rebela e sai de casa, passando a ter uma vida e amigos. O mundo aceita Penélope como ela é e, então surge um interesseiro e a pede em casamento visando publicidade. A mãe a faz aceitar o casamento para que ela volte ao normal (padrão) e seja feliz. Na cerimônia a garota diz não e se tranca no quarto. Quando a mãe bate na porta e implora que ela se case, ela grita de volta que se ama e não quer mudar. Ela se aceita e com a aceitação vem a transformação. 

A garota fica maravilhada ao descobrir que durante mais de vinte anos de sofrimento, todo poder estava no amor próprio que ela poderia se dar. Neste ponto é que achei válido o filme. A mocinha não precisou do príncipe encantado, do herói que salva. Ela descobriu que o poder salvador estava nela. Amar-se é o que de melhor a gente pode fazer, por si e pelos outros. Na auto aceitação nos transformamos, vibramos e somos capazes de atrair coisas boas. Fora que para uma feminista de carteirinha esse gran finale diz tudo: não precisamos de quem nos salve, nos salvamos e vamos ao encontro do outro apenas para estabelecer uma parceria em pé de igualdade, para tornar nossa jornada mais florida.

domingo, 26 de maio de 2013

PARA NÃO ESQUECER

O tempo passa e faz com que esqueçamos as pérolas que as crianças pequenas soltam tão facilmente todos os dias. Geovana está
com cinco anos e hoje foi um dia de muita inspiração.
Diálogos
1.       _ Geovana, você é a caçulinha favorita da mamãe!
_ Aaaaaaah! Mããããããe! Mas só tem eu de caçulinha, né! (Esperta esta garota.)
2.       _ Mãe, amanhã você não vai trabalhar porque você esta muito gripada, né?
_ Vou sim, amor.
_ Não,  mãe. Porque você gripada assim não faz nada e ainda passa gripe para os outros. (Sabe das coisas.)
 Frases:
1.       Minha tia está indisponível. (De onde esta criança tirou essa palavra?)
2.       Eu tô sendo corajosa, mãe, porque sem coragem a gente nem vive, né? (Enfrentando formigas...)
3.        Deus pai dos ternos, meu guarda-roupa tá cheio de formiga!!!!!!!!! (Acho que era pra ser Deus pai eterno)
Decidindo nome para a cachorra:
Acho que vou trocar o nome dela, não tô gostando mais de Julie. Vou chamar ela de Romeu e Julieta.



segunda-feira, 15 de abril de 2013

O encantador das tardes


Tarde sufocante e céu nublado, por volta de quatro da tarde entrei num coletivo rumo ao centro de Porto Velho. Não havia lugar para sentar e à medida que o ônibus avançava novos passageiros me empurravam em direção à porta de saída. Já bem próxima, ouço :  “...sua tristeza é tão exata e hoje em dia é tão bonito...”.Busco o dono da voz e do atrevimento de cantar no busão lotado, quando percebo que é o motorista quem canta enquanto manobra o volante. Cúmplice da ousadia, acompanho “...já estamos acostumados a não termos mais nem isso..”    Antes do ponto em que eu ia descer, ainda cantamos Monte Castelo e um trecho de Teatro dos Vampiros. Sorrimos um ao outro com cumplicidade na despedida e quando novamente olhei o céu, o sol se punha numa alegria primaveril, dourando as nuvens.  

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013


“Sempre em frente, foi o conselho que ela me deu, sem me avisar que iria ficar pra trás.”
(Engenheiros do Hawai)


Sempre em frente também é o conselho que lhe dou, mas prefiro avisar que vou sim ficar para trás. Não vou estar lá no seu futuro glorioso, nem compartilhar seus sonhos, ou ouvir suas dores.  Não serei palco para que você atue, nem plateia para te aplaudir. Sem rancor, apenas fico.  Fico na impossibilidade da vida. Fico por minha própria covardia e meu medo. Fico porque respeito sua vontade e seus limites. Mas mesmo ficando, meu amor te acompanha.
 (Escrito numa outra vida, muito tempo atrás)



sábado, 23 de fevereiro de 2013

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@edilenegama3

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Crônicas de quem aprende - experiências de quando eu trabalhava em sala de aula


O menino no armário
Bonito. Alto para a sua idade. Estranho. No primeiro dia, me disseram que fazia cocô e xixi na roupa, ou no chão da sala. Um nojo. Podia também ser perigoso. Tomava muitos remédios. Não podia facilitar.
Ele não me olhou, nem quando chamei seu nome. AUTISTA (escrito a lápis no diário de classe). Permaneceu sentado. Seguiu a fila para a merenda. Fez cocô no chão da sala durante o recreio. Aceitou ser asseado. Permaneceu sentado. Foi embora com sua mãe.
Eu? Me assustei. Depois me assustei mais. Depois quis gritar socorro. Depois resolvi tentar. Depois me encantei. Me desencantei. Depois me encantei de novo. Aceitei.  E senti saudades.
Estava revoltado porque havia mudado de casa e amava uma mangueira, onde às vezes ficava até anoitecer, em cima de um galho. Tomava remédios. Autismo, diziam. Ficava muito irritado em algumas ocasiões. Não demonstrava afeto e não interagia. Informações que a mãe me passou sobre o filho. O pai não havia aguentado a pressão e abandonara os dois quando ele tinha cinco anos. Agora estava com quase doze.
Havia dias em que ele era todo apatia, outros agressividade calada. Ocasiões em que se punha a falar e notei que repetia as falas de um programa televisivo sobre planetas. Adorava esses programas, mas a fala era uma repetição literal e monocórdica. Quando parecia estar ausente, era presença garantida dentro do armário da sala. E me punha em desespero quando resolvia bater a cabeça na parede.
As outras crianças apontavam. Eu explicava. Tentava ignorar comportamentos e estabelecer contato. Dois ou três dias depois de falar sobre um tema em sala, ele poderia repetir minhas palavras exatas com a voz incômoda aos meus ouvidos. Parecia gostar quando eu levava revistas com tema sobre os planetas, ou sobre animais. Olhava durante muito tempo e eu sentava ao lado dele e falávamos sobre as imagens. Não. Eu falava e ele talvez ouvisse. Recortava as revistas. Copiava do quadro em algumas ocasiões.
Um dia quebrou com um chute o nariz de um colega de sala, que era muito atrevido e metido a engraçadinho. Foi tão rápido, enquanto eu escrevia no quadro, que nunca soube exatamente como aconteceu. A mãe do menino quis iniciar um movimento para tirar aquele perigoso aluno da escola. Fui a casa dela, conversei e fomos contornando a situação. Carlos continuava.
Um dia adoeci, faltei ao trabalho. No outro dia ele me trouxe uma plantinha. Um mato, para ser exata. Colocou sobre minha mesa. Você estava doente, me disse. Chorei. Tentei abraça-lo, mas ele não permitiu.
Carlos mudou-se antes do segundo semestre. Guardei aquele matinho em meu coração para sempre.